Abigail Adams Smith – Câncer de mama e mastectomia no século XIX

Estamos no mês de outubro, o mês da campanha do #OutubroRosa.  A campanha tem como objetivo a conscientização das mulheres sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama. Em razão da importância do tema, eu resolvi escrever um pouco sobre uma figura que me parece não ser muito conhecida por aqui: Abigail Adams Smith.

Abigail “Nabby” Amelia Adams Smith, comumente referida por Abigail Adams Smith, é a primogênita de Abigail e John Adams – fundador e segundo presidente dos Estados Unidos. Nascida em 1765, Nabby foi diagnosticada com câncer de mama em fevereiro de 1811. Ela era uma mulher esclarecida, e o câncer era uma doença terrível como é hoje. Nabby escreveu uma carta para seus pais na ocasião, e disse que seu médico havia descoberto “um câncer em meu seio”. Tão logo eles receberam a carta, os Adams escreveram de volta à filha e pediram que ela fosse até Boston para tratar a doença.

Em Boston, Nabby escreveu para Benjamin Rush, um dos melhores médicos do país e amigo de John Adams. O tumor estava visível a olho nu, e Nabby disse ao doutor que “estava grande e crescendo”, mas disse que era “móvel” e que não estava anexado à parede torácica – o que o médico tomou como boas notícias.

Benjamin Rush, sabendo que Nabby estava com seus pais, escreveu para John e Abigail Adams a seguinte carta:

Eu vou começar essa carta respondendo a de sua filha. Eu prefiro dar minha opinião e meu conselho desta forma. Você e a Sra. Adams podem comunica-la gradualmente e de uma maneira menos apta a estressa-la e causar alarme.

Depois da experiência de mais de cinquenta anos em casos similares ao dela, eu devo protestar contra a aplicação de quaisquer medicamentos no local em busca de alívio. Às vezes eles curam, mas em 19 entre 20 casos de tumores no seio eles causam danos ou suspendem a doença até que o único remédio que tem efeito não seja mais eficaz. Esse remédio é a faca. Pelo que ela me disse, da mobilidade do tumor, agora é a hora apropriada para a operação. Se ela esperar supurar ou inflamar, pode ser tarde demais. Eu repito: que não haja demora. A expectativa de vida dela depende disso… Eu sinceramente simpatizo com ela e com o senhor e com a querida Sra. Adams nessa aflição pela qual a família passa, mas todo o processo levará apenas alguns minutos, e se não for feito, o tumor será uma fonte de sofrimento e dor por muitos anos. Eu fico chocado em pensar nas consequências da procrastinação.

Como podemos ver, a mastectomia era a única chance de Nabby (por mais terrível que a alternativa fosse, já que não havia anestesia naquele tempo!), e então a operação foi marcada para o dia 8 de outubro de 1811. Um dia antes da cirurgia, John Warren, o cirurgião mais qualificado de Boston, se encontrou com a paciente e disse a ela o que esperar. Eu não posso nem imaginar o medo que ela sentiu! Mas a carta de Benjamin Rush não deixou muita opção também né? “Eu fico chocado em pensar nas consequências da procrastinação”.

A cirurgia aconteceu na casa dos Adams, em Quincy, Massachusetts. Foi realizada por John Warren, que foi assistido por seu filho Joseph e vários outros médicos. Os exatos detalhes da cirurgia não estão disponíveis, mas deve ter sido como qualquer outra cirurgia do século XIX. De acordo com Jim Olson: “Os instrumentos de Warren dentro de uma caixa de madeira, em cima da mesa, eram simples: um garfo grande com duas pontas afiadas de seis polegadas cada uma, uma navalha com um cabo de madeira, e uma pilha de ataduras. No canto da sala, um pequeno fogão cheio de carvão aquecia uma pesada espátula de metal”.

Agora, nesse site, eu encontrei que a cirurgia foi realizada na mesa da cozinha da casa de John e Abigail Adams e que Nabby estava totalmente vestida (deixando apenas o seio esquerdo exposto). De acordo com essa fonte, ainda, é provável que todas as velas da casa tenham sido levadas para o cômodo e que tenham forçado Nabby a tomar whiskey.

Jim Olson, por outro lado, afirma que Nabby estava vestida como se estivesse indo para a missa, e que os médicos estavam todos de sobrecasacas, camisas e gravatas. Nabby desabotoou apenas a parte de cima do vestido e descobriu apenas o seio ‘doente’, permanecendo inteiramente vestida. Ela sentou em uma cadeira reclinável, onde John Warren prendeu sua cintura, suas pernas, pés e braço direito. O braço esquerdo foi levantado acima da cabeça para que o músculo peitoral maior empurrasse o seio para cima.

Em seu artigo, Jim Olson descreve a operação: “O médico pegou o garfo de suas pontas e enfiou fundo dentro do seio. Com sua mão esquerda, ele segurou no garfo e o levantou, puxando o seio da parede torácica. Ele pegou a navalha e começou a cortar a base do seio, movendo do meio para o lado esquerdo. Quando o seio estava completamente cortado, Warren o retirou do peito de Nabby com o garfo. Mas o tumor era maior e estava mais espalhado do que ele esperava. Tumores duros podiam ser sentidos nos gânglios linfáticos embaixo do braço esquerdo de Nabby. Ele cortou aquela região e retirou nódulos e tumores. Nabby se fazia caretas e grunhia, se contorcendo na cadeira, com sangue manchando suas roupas e a camisa e os sapatos do médico. Seu cabelo estava ensopado de suor. Para estancar o sangramento, Warren pegou a espátula do fogão e aplicou várias vezes na ferida, cauterizando os piores pontos de sangramento. Com cada toque, a fumaça subia para o ar e preenchia a sala com o distinto cheiro de carne queimada. Warren, então, suturou as feridas, colocou as ataduras, se afastou de Nabby e misericordiosamente disse que tinha acabado. O procedimento levou menos de vinte e cinco minutos, mas levou mais de uma hora para fechar as feridas. A mãe e a filha de Nabby a ajudaram a colocar o vestido por cima do ombro esquerdo, como ditava a modéstia. Os cirurgiões ficaram abismados com a forma que a paciente aguentou a dor”.

Santo Deus.

Depois do procedimento, Nabby passou por um longo processo de recuperação. Ela não teve nenhuma infecção decorrente da cirurgia, mas se sentiu fraca e teve febre por meses depois de tudo. Ela não podia voltar para Nova York – onde ela vivia com seu marido e seus filhos, então Nabby permaneceu em Quincy sob os cuidados de seus pais. O que a fortaleceu nesse período foi a crença de que estava curada, e o Dr. Rush inclusive escreveu a John Adams parabenizando a família. Sete meses depois da cirurgia, Nabby voltou para a casa do marido.

Mas ela não estava curada. Nas palavras de Jim Olson: “Pacientes com câncer de mama que se espalhou para os gânglios linfáticos não tem boas chances de sobrevivência, mesmo com cirurgia moderna, tratamentos de radiação e quimioterapia. No caso de Nabby, muito antes de Warren realizar a mastectomia, o câncer tinha se espalhado”. As más notícias vieram em 1813: o câncer tinha voltado. Em toda parte.

Nabby faleceu naquele mesmo ano, no dia 9 de agosto, na casa de seus pais. Ela tinha 48 anos.

Apenas a título de curiosidade:

1) Fanny Burney, autora de clássicos como Evelina, Camilla e Cecilia e contemporânea de Jane Austen, também precisou se submeter a uma mastectomia (sem qualquer anestésico) para se livrar de um câncer de mama.

2) Na minissérie da HBO John Adams, a mastectomia de Nabby é mostrada brevemente no início do episódio 7. Na série, a cirurgia acontece em um quarto e Nabby é amarrada na cama (além de ser segurada pelos assistentes do cirurgião). É bem ruim de assistir.

É triste pensar que ela precisou passar por um procedimento tão difícil e doloroso e não sobreviver. Mas é também um lembrete de que o câncer de mama é um assunto muito sério! Esse ano – dia 6 de janeiro de 2018, para ser exata – eu perdi uma prima muito querida para essa doença. Nós estamos no século XXI, nós temos cirurgias modernas e quimioterapia, mas o tratamento ainda assim é doloroso e difícil… e às vezes a cura não vem. Minha prima era ainda mais jovem do que Nabby, e deixou uma filha de 12 anos e um filho de 16. Então, não tratem o câncer de mama com leviandade e lembrem: o diagnóstico precoce pode salvar vidas!

Espero que tenham gostado!

Com carinho, Roberta.

Fontes: Jim Olson

Library Company

Woman History Blog

Feather Foster

Postado por: Roberta Ouriques

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